(Este é o segundo texto sobre a série Explicando – A Mente. Se você quiser ler o primeiro, clique aqui. Ah, e tem spoilers!)
Você sabia que Mary Shelley teve a ideia que originou Frankenstein durante um sonho? E que Mick Jagger também sonhou com Satisfaction? E o que dizer desse cara, que afirmava que seus quadros eram reproduções fiéis dos seus sonhos?

Grandes personagens, grandes sonhos, grandes descobertas. Mas o que, afinal, nós sabemos sobre os sonhos?
Esse tema intriga as pessoas há muito tempo. O primeiro registro de um sonho de que se tem notícia é de um rei da Mesopotâmia, e já naquela época havia uma “intérprete” para ajudá-lo a compreender o significado dos seus sonhos. Durante muito tempo, os sonhos foram inclusive interpretados como mensagens divinas. Mas será que existe mesmo significado?
O que sabemos é que, um tempo depois de dormir, atingimos um estado profundo de sono, em que o nosso cérebro inteiro parece estar acordado, exceto por uma parte: a responsável pelos movimentos. Estamos ali, paralisados enquanto experimentamos um turbilhão de sensações, e a única parte do corpo que conseguimos mexer são os olhos. Por isso, essa fase do sono é chamada de REM (de Rapid Eye Movement, Movimento Rápido dos Olhos, em inglês). É assim que passamos cerca de um quinto do nosso sono: vivendo intensamente num mundo de fantasia, e interagindo com ele apenas com os olhos.
Aparentemente, os sonhos não têm lógica nenhuma. E não é por falta de tentativas de achar significado: ao longo da História, muitos foram os filósofos e cientistas (e alguns charlatães, claro) tentando dar significado aos sonhos. Recentemente, na virada do século XIX para o século XX, dois deles reacenderam o debate sobre o significado dos sonhos: Santiago Ramón y Cajal, o pai da neurociência, e Sigmund Freud, o pai da psicanálise; enquanto o primeiro via nos sonhos uma “tempestade elétrica” que estimulava aleatoriamente os neurônios (os quais, aliás, ele havia descoberto), e, assim, causava a construção de histórias malucas e sem sentido, o segundo via nos sonhos um material riquíssimo de significados, memórias e desejos (especialmente sexuais).
A relação entre sonhos e memórias é uma das mais intrigantes. De fato, parece haver uma relação muito próxima: são comuns os relatos de sonhos envolvendo fatos acontecidos durante o dia. Mas e como explicar quando isso acontece até mesmo com pessoas com sérios problemas de memória (como o pobre Henry)? Aparentemente, os sonhos são uma história cujo enredo é criado pelas memórias e emoções, de uma forma que ainda não compreendemos bem.
Para tentar compreender melhor, o episódio mostra a história de Allison McCarthy, uma das pessoas capazes de ter sonhos lúcidos; isso mesmo, ela é capaz de controlar os próprios sonhos. Isso não é mágica ou bruxaria, longe disso: é uma habilidade, que pode ser treinada por qualquer um. Se você quiser saber por onde começar, a dica dela é simples: anote os seus sonhos; quanto mais você se esforçar para lembrar os sonhos, mais você vai conseguir notá-los, e, com o tempo, passar a controlá-los (mas cuidado, pode ser meio assustador).
A prática do sonho lúcido tem tudo a ver com a ideia do começo: quando você está sonhando, o seu cérebro está tão acordado quanto durante o dia (às vezes até mais). Por isso, algumas pesquisas indicam que dormir ajuda inclusive a solucionar problemas. Até mesmo em ratinhos de laboratório, quando postos num labirinto e submetidos a uma soneca, foi possível observar que 1) durante o sono, havia atividade cerebral nas mesmas áreas do cérebro que estavam trabalhando enquanto eles tentavam sair do labirinto, e 2) quando acordavam, tinham mais facilidade para achar a saída.
A propósito, parece que os sonhos não são exclusividade dos humanos (pra quem tem bichinho de estimação isso não é novidade): mamíferos, peixes, pássaros e até moluscos parecem ter algo muito parecido com o nosso sono REM.
Mas o que só nós conseguimos usar dos sonhos é a criatividade: com tanta coisa boa criada nos sonhos de grandes artistas, vou ali dormir e ver se também tenho alguma ideia genial.